Celebrado escritor uruguaio realizou a conferência de
encerramento do congresso do Conselho Latino-americano de Ciências
Sociais (Clacso), realizado na capital mexicana, em que tratou do tema
“Os direitos dos trabalhadores: um tema para arqueólogos?”. Em sua fala,
Galeano demonstrou como esses direitos são resultado de uma árdua luta
com 200 anos de história, mas têm sido cada vez mais violados por
governos e grandes corporações. Marcel Gomes
Publicado em: http://www.cartamaior.com.br
Cidade do México – O escritor uruguaio Eduardo Galeano encerrou na noite
de sexta-feira (9) o congresso do Conselho Latino-americano de Ciências
Sociais (Clacso), realizado na capital mexicana, com uma concorrida
conferência pautada em um tema caro para os cientistas sociais: a
decadência do mundo do trabalho.
Intitulada “Os direitos dos
trabalhadores: um tema para arqueólogos?”, a intervenção de Galeano,
assistida por ao menos mil pessoas, que lotaram auditório e salas anexas
do hotel onde acontecia o congresso, foi construída como um “mosaico”
de histórias essenciais sobre os “200 anos de lutas dos trabalhadores do
mundo”.
A maior parte delas está disponível no último livro do escritor, “Os filhos dos dias", lançado neste ano no Brasil.
Galeano tratou, por exemplo, da greve operária de Chicago em primeiro
de maio de 1886, violentamente reprimida pelas forças de segurança. A
data tornou-se o Dia do Trabalho em muitos países, mas não nos Estados
Unidos.
“Há sete ou oito anos estive em Chicago e pedi aos amigos
que me receberam que me levassem onde aconteceram os protestos. Mas me
surpreendi porque eles não conheciam a história”, disse ele. “Só
recentemente recebi uma carta deles contanto que tinha acabado de haver
uma manifestação na cidade, para lembrar as greves daquela época”,
completou.
O escritor, de 72 anos e mundialmente conhecido pela
obra "As veias abertas da América Latina", também lembrou o médico
italiano Bernardino Ramazzini (1633-1714), precursor da medicina do
trabalho. Segundo o uruguaio, o médico natural de Pádua escreveu o
primeiro tratado do gênero, vinculando tipos de ocupações laborais com
enfermidades específicas.
“Mas ele também escreveu que pouco
poderia ser feito com as condições de vida daquelas pessoas, que comiam
mal e trabalhavam de sol a sol”, afirmou. Ainda sobre a dureza do
trabalho, Galeano lembrou que em 1998 a França reduziu a jornada a 35
horas por semana, mas a medida já foi desfeita.
“Era o sonho de
Thomas Morus. Para que servem as máquinas, senão para ampliar nossos
espaços de liberdade? Mas acabou em apenas 10 anos. Para o trabalhador,
restou desemprego e angústia”, disse o uruguaio, lembrando a crise
financeira global iniciada em 2008.
Galeano ainda citou o pouco
interesse dos países e grandes empresas pelos 189 acordos e convenções
da Organização Internacional do Trabalho (OIT), dos quais só 14 foram
ratificados pelos Estados Unidos.
“Justamente o país em que o
primeiro de maio não é celebrado”, destacou. Ao encerrar sua
participação, Galeano contou a história de Maruja, trabalhadora
doméstica e moradora de Lima, no Peru, também disponível em seu último
livro. É esta que segue:
"Marzo, 30, Día del servicio doméstico"
"Maruja no tenía edad.
De sus años de antes, nada contaba. De sus años de después, nada esperaba.
No era linda, ni fea, ni más o menos.
Caminaba arrastrando los pies, empuñando el plumero, o la escoba, o el cucharón.
Despierta, hundía la cabeza entre los hombros.
Dormida, hundía la cabeza entre las rodillas.
Cuando le hablaban, miraba el suelo, como quien cuenta hormigas.
Había trabajado en casas ajenas desde que tenía memoria.
Nunca había salido de la ciudad de Lima.
Mucho trajinó, de casa en casa, y en ninguna se hallaba. Por fin, encontró un lugar donde fue tratada como si fuera persona.
A los pocos días, se fue.
Se estaba encariñando."
* Viagem realizada a convite do Clacso
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